09 dezembro 2006

Assim falou Zaratustra

“ (…) É noite: falam mais alto, agora, todas as fontes borbulhantes.
E também a minha alma é uma fonte borbulhante.
É noite: somente agora despertam todos os cantos dos que amam.
E também a minha alma é o canto de alguém que ama.
Há qualquer coisa insaciada, insaciável, em mim; e quer erguer a voz.
Um anseio de amor, há em mim, que fala a própria linguagem do amor.
Eu sou luz; ah, fosse eu noite!
Mas esta é a minha solidão: que estou circundado de luz.
Ah, fosse eu escuro e nocturno!
Como desejaria sugar os seios da luz!
E até vós desejaria abençoar, pequenos astros cintilantes e vaga-lumes, lá no alto! - e ser feliz com as vossas dádivas de luz.
Mas eu vivo na minha própria luz, sorvo de volta em mim as chamas que de mim rompem. (…)
Para onde foram as lágrimas dos meus olhos e o frouxel do meu coração? Ó solidão de todos os dadivosos! Ó silêncio de todos os que espalham luz!
Muitos sóis gravitam nos espaços vazios: falam, com sua luz, a tudo o que é escuro - como silenciam.
Oh, essa é a hostilidade da luz por tudo o que é luminoso: implacável percorre ela sua órbita.
Injusto, no fundo do seu coração, com tudo o que é luminoso; frio para com os outros sóis - assim segue, cada sol, o seu próprio caminho.
Como uma tempestade, percorrem os sóis, velozmente, suas órbitas: esse é o seu curso.
Seguem, inexoráveis, a sua vontade: é essa a sua frieza.
Ó seres escuros, nocturnos, somente vós criais o calor, aurindo-se dos corpos luminosos!
Somente vós bebeis o leite e o bálsamo dos seios de luz!
Ah, há gelo em volta de mim; queima-se minha mão tocando em gelo!
Ah, há uma sede, em mim, que almeja pela vossa sede!
É noite: ai de mim, que tenho de ser luz!
E sede do que é nocturno. E solidão!
É noite: como uma nascente, rompe em mim, agora, o meu desejo - e pede-me que fale.
É noite: falam mais alto, agora, todas as fontes borbulhantes. (…)”

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